junho 16, 2007

Receita fácil


A Marina de Cascais, tirando o Verão de Agosto, não é muito cativante. A Brasserie também não.

Eu não conhecia a Marina de Cascais e daqui peço humildemente ao dr. Capucho que meta aquilo na ordem, que deve e pode. Está uma tristeza. Se aquilo foi o chique de Cascais durante algum tempo, pois esperam-se melhoras – pinturas no descalabro, lixo nas ruas, bares (o que eu gosto desta mania de tudo ser “lounge”) com som que valha-nos deus, esplanadas vazias, turistas meio perdidos. Já sei que querem corrigir-me: era dia de semana e havia vento. Pois é nesses dias que devemos ir verificar como são as coisas, de facto. E, de facto, são tristes. Está bem que há a baía de Cascais, propriamente dita – mas essa já lá estava há muito, antes da Marina, e não precisava que a estragassem, juntamente com uma parte da vila.

Eu fui lá com um fito: jantar a horas tremendamente decentes. Um jantar tranquilo mas palrador, ameno, de conversa iluminada por uma bebida e, até, por uma comida à qual não fosse difícil aderir. Nem sempre é possível. O bife é o reenvio à infância e à adolescência, àquele género de refeições que não dão trabalho a pensar nem, na maior parte dos casos, a preparar (pelo menos se nos escusarmos a comentar o preço do bife).

O bife é o emblema da humanidade convertida ao fogo – e abandonando a condição vegetal. É o pânico dos vegetarianos. O horror dos que nos acham semelhantes a abóboras. Tenho o maior respeito por eles; mas peco frequentemente por um bom bife. Um bife que resuma a natureza da palavra “suculento”. Um bife que redima o apetite e a vontade de comer. Um bife, portanto, nada de mais.

Desta vez, em vez de procurar os lugares habituais onde posso encontrar um bife, entrei na Brasserie de l’Entrecôte da Marina de Cascais. Conheci, há alguns anos, a Brasserie da Rua do Alecrim, a dois passos do Chiado, e garanti-me – e ao meu estômago – uma receita fácil. Ali estaria um bife; não o tradicionalíssimo bife lusitano (e argentino nem pensar, e americano longe de nós), mas uma peça de carne. O “entrecôte”. A salada de alface do dia com nozes chegou então, com pãozinho quente, estaladiço, de duas qualidades, óptimo para barrar com manteiga ou – no meu caso – para apreciar a textura da alface. Que era óptima. Havia uma lista de vinhos relativamente simples, sem grandiloquência nem muitas peças de quadro de honra, mas, que diabo, era um bife – pois viesse a cerveja. Das indicadas na lista (várias), só havia uma, afinal. Foi essa que veio.

O “entrecôte” com molho de ervas e batatinhas fritas encaminhou-se para a nossa mesa ao fim de rigorosos vinte e cinco minutos, depositado numa travessa aquecida. Era carne. E era molho. Que dizer-vos mais acerca da carne? Que era carne, razoável, boa para cortar à faca, decente. Já do molho dir-vos-ei que não se conteve – daí a minutos era vê-lo soltar-se, mal ligado (ah, um molho mal conseguido já foi considerado motivo suficiente para suicídio do cozinheiro), separando a pasta com as ervinhas da gordura que o cozinhou, amarelada, na margem do prato. O retrato fica. Quanto às batatas fritas, que devia ser a bandeira a cumular um bom bife, simplesmente sabiam a óleo. A óleo de fritar, se me faço entender. Como havia ainda três quartos de bife depois de abandonadas as batatas ao seu túmulo, pedi novo cestinho de pão, daquele estaladiço de há pouco. Veio, mas frio e sem dar estalinhos.

Veio então a lista de sobremesas, com “cheesecake”, tarte de maçã, bolo de chocolate, sopa de morango com gelado de baunilha com canela em pó, mousse de chocolate com compota de ananás e pimenta verde, leite creme queimado, abacaxi, sorbet de limão, e gelados de laranja, maçã, ananás e chocolate. O “cheesecake” estava sereno, sossegadíssimo, e não o incomodámos muito. Veio então o café e um whiskey irlandês, que serviram de encosto enquanto verificámos a lista de vinhos a copo, onde havia, entre outros, Quinta de La Rosa (5,25€), Esteva (3,30€), Quinta da Bacalhôa (10,20€), Altas Quintas (10,20€), José de Sousa (6,30€), Quinta das Cerejeiras (7,55€), Marquês de Riscal Rioja (8,20€), Periquita (2,65€) e apenas um único branco, Planalto (2,65€). Que hei-de dizer-vos? Que é uma tristeza.

À Lupa
Vinhos: * * *
Digestivos: * *
Acesso: * * *
Decoração: * * *
Serviço: * *
Acolhimento: * *
Mesa: * *
Ruído da sala: * * *
Ar condicionado: * * *

Garrafeira
Vinhos tintos: 42
Vinhos verdes: 3
Vinhos brancos: 12
Aguardentes & Conhaques: 12
Portos & Madeiras: 8
Uísques: 14

Outros dados
Charutos: não
Estacionamento: fácil
Levar crianças: sim
Área de não fumadores: sim
Reserva: aconselhável
Preço médio: 25 euros

Restaurante Brasserie de l’Entrecôte
Marina de Cascais, Loja 43
2750 - 001 Cascais
Tel: 21 481 81 96
Não encerra

in Revista Notícias Sábado - 16 Junho 2007

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