agosto 25, 2007

Viagens na minha terra


Num dos mais belos percursos do Douro, entre a Régua e o Pinhão, o D.O.C, é uma revelação.

O leitor sabe que não sou imparcial, que frequen­temente sou injusto quando se trata de fazer comparações e que não acho graça a novidades. Dito isto, viajo ao longo do rio da minha infância, o Douro, para visitar um dos novos restaurantes da região.

Falhei, até agora, escrever sobre o Cepa Torta, em Alijo, que já há alguns anos se transformou numa espécie de santuário da gastronomia regional do Norte do Douro – mas não quero deixar de assinalar o D.O.C., o novo restaurante de Rui Paula (que, com a mão decidida e séria da sua mulher, Cristina Canelas, continua a manter o Cepa Torta), estaciona­do junto de um pequeno cais na Folgosa do Douro, a meio caminho entre a Régua e o Pinhão.

Não sei se conhecem esta estrada, a marginal do Douro, mas esclareço que se trata de uma das mais bonitas de Portugal. Seja como for, o crepúsculo desta marginal, rente à água, é matéria de romance. O D.O.C, tem, além de um cais fluvial, uma esplana­da que oferece uma das melhores paisagens do rio – e quando a noite cai é um espectáculo incompará­vel. Por isso, não o comparo com nada. Quem sabe do que falo, recorda; quem não sabe, pois que vá.

O cardápio do D.O.C., que nasceu em Abril passado, é cuidado, sazonal e apetitoso. Refiro, para abrir, o seu 'carpaccio' de polvo, os milhos de camarão, o recheio de sapateira com salada de tomate, o papo d'anjo de 'foie gras' de vinho do Porto e maçã, o 'magret' de pato fumado com salada de requeijão, amêndoa e mel e ainda o creme de espargos verdes com vieiras e azeite trufado.

Apaixonado que sou pelos milhos (a nossa "polenta"), foi essa a minha opção como entrada, dividida com uma chamuça de alheira e moira, e um 'carpaccio' de polvo. Os milhos eram excelentes, suculentos e molhadinhos, onde alguns camarões tinham adormecido com verduras a fazerem a cama. Cinco estrelas. A chamuça veio crocante, com uma massa muito bem definida, e o polvo, laminado, apareceu na companhia de uma salada cheia de sabor e uma fatia de queijo gratinado. A opção seguinte seria ainda a dos milhos, ao deparar com eles na companhia de bacalhau e rodovalho, além de um bacalhau com broa e um cherne em crosta de legumes. O novilho maronês, das encostas da serra do Alvão, cativou-me em duas amostras: pri­meiro, com isca de 'foie gras' e uma caminha de pi­nhões e feijão verde, muito, muito bom; depois, um medalhão de boa carne com creme de queijo da Serra (suavíssimo, nada do que se come por aí), acompanhado de um arroz de três cogumelos, fritinho e sabo­roso com polvilho final de cebolinho; fantástico. É necessário, aqui, um 'intermezzo': tínhamos come­çado com um espumante de Cabriz, para aligeirar apresentações – que é servido a copo, juntamente com outros vinte vinhos –, e seguira viagem com um outro tinto do Douro, ligeiramente refrescado, como se exige.

Houve ainda um polvo a passar pela mesa, grelhado com azeite, tenríssimo. Para trás ficaram o 'magret' de pato com arroz de frutos secos e figos em vinho do Porto, o cabritinho no forno, a perdiz do Douro com dois purés (geralmente, o de abóbora e o de castanhas), o 'risotto' de sapateira, a bochecha de porco bísaro com torrada de azeite, ou o cachaço de bísaro (cozinhado a baixa temperatura por doze horas).

Antes de pedirmos as sobremesas, veio a von­tade de repetir o 'foie gras', e pediu-se uma amostra da terrina, puríssima, odiada por vegetarianos e médicos do colesterol: perfeita, com uma torradinha auxiliar. Para facilitar, veio também um 'late harvest' do Douro. E as sobremesas chegaram então, devasta­doras: uma chamuça de queijo 'chèvre', com gelado de mel, requeijão, doce de abóbora e amêndoa, arrepiante; o queque de chocolate era um 'petit gâteau', ou 'demi-cuif, com o seu caldo interior de chocolate quente, servido com sorvete de framboesa; e então, culminando, com dois tipos de Porto para acompa­nhar (um 'tawny' Vista Alegre e um 'vintage' Noval), o vulcão: crepe de leite-creme crocante com frutas exóticas e molho de framboesa, primeiro. Seis estre­las em cinco. O vulcão e o 'tsunami' a seguir: tarte de maçã com queijo de cabra e gelado de azeite.

Ainda tive tempo para verificar que há 140 tintos muito bem escolhidos e apresentados, cerca de 70 portos à disposição, 20 moscatéis e colheitas tardias – e um menu de azeite que hei-de provar da próxima vez. Ao sair para a varanda sobre o rio, verifiquei que era noite de Lua nova, e que as estrelas continuam a favorecer o grande Douro. Com D.O.C. Parabéns.

À Lupa
Vinhos: * * * *
Digestivos: * * * *
Acesso: * * * *
Decoração: * * *
Serviço: * * *
Acolhimento: * * * *
Mesa: * * *
Ruído da sala: * * *
Ar condicionado: * * * *

Garrafeira
Vinhos tintos: 146
Vinhos brancos: 48
Espumantes & Champanhes: 16
Aguardentes portuguesas: 16
Colheitas tardias e moscatéis: 20
Portos & Madeiras: 74
Uísques: 18

Outros dados
Charutos: sim
Estacionamento: fácil, tem parque
Levar crianças: sim
Área de não fumadores: não
Reserva: muito aconselhável
Preço médio: 35 Euros

RESTAURANTE D.O.C.
EN 222 - Folgosa do Douro
5110-204 Folgosa
Telefone: 2S4 858 123
Não encerra

in Revista Notícias Sábado – 25 Agosto 2007

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