julho 10, 2010

Nenhuma inocência

Enquanto na África do Sul se decide este fim-de-semana qual a equipa melhor preparada para resistir às grandes pressões – se a Holanda entusiasta ou a Espanha manhosa (ambas, o entusiasmo e a manha, são qualidades a distinguir) –, o futebol português entra no seu período habitual de esquizofrenia, anunciando nomes de novos contratados. Essa febre vai continuar a revelar mais surpresas; as expectativas, essas, serão alimentadas conforme a bolsa e a tendência suicida dos clubes. Nada que não se resolva daqui até Dezembro, como de costume.

Há uma certa regularidade na forma como o calendário decorre e é alimentado pela imprensa: contratações explosivas que muitas vezes não se confirmam, pré-época fantasiosa, arranque inexpressivo e “campeonato de Inverno” preparado para todas as vinganças. É neste contexto que, dando como quase adquirido que Raul Meireles e Bruno Alves podem sair do plantel do FC Porto (gostava de juntar uma certa lista a estes nomes, mas por razões diferentes), acho muito importante observar o comportamento de André Villas-Boas.

A herança que Villas-Boas reivindicou não é despropositada nem despicienda: ao citar Bobby Robson como seu inspirador ou mentor, o novo técnico do FC Porto escolheu um perfil (discreto), um modo de relacionamento com o exterior (cavalheirismo), um tipo de exigência aos jogadores (directo e frontal – como parecem ter sido alguns dos seus reparos a certos malabaristas) e, certamente, um tipo de jogo, que só o decorrer do campeonato confirmará. Bobby Robson foi o modelo de treinador que, nesta coluna, defendi desde meados da época passada. André Villas-Boas invocou esse modelo, essa herança e – acredito – esse modo de entender o futebol. É o modelo mais adequado aos adeptos do FC Porto: eficácia que não se anula com a criatividade no jogo, beleza que não perde de vista o objectivo fundamental: ganhar. Lembram-se de Robson? “Beautiful”, dizia ele, “jogo, passe, remate, goal...” Nenhuma inocência. Não há melhor.

in A Bola - 10 Julho 2010

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