setembro 24, 2011

Meio golo

Nelson Rodrigues, o cronista dos cronistas, achava que humilhar o adversário não era coisa de goleada. Enganou-se em relação ao que aconteceu no ano passado, com o 5-0 no Dragão. Quando Nelson, na arquibancada do Mário Filho, aliás Maracanã, assistia a um 1-0 a favor do Fluminense, festejava abundantemente e a crónica do dia seguinte escorria com grande ironia na ‘Gazeta dos Esportes’ ou no ‘O Globo’. Ganhar de 1-0, como ele escrevia, poupava o adversário mas provocava-lhe uma dor infinita, aquela que Ícaro sentia quando se elevava nas alturas ou que Sísifo provava ao subir pela montanha acima; mas não deixava ao adversário a hipótese de uma rendição nem a honrosa saída de não ter desculpa. O ideal era, mesmo, ganhar por meio golo a zero, hipótese ainda impossível.

No ano passado, a vitória valeu por todos os golos mas, sobretudo, por aquela surtida de Hulk pela lateral direita batendo David Luiz e passando para o espaço onde havia de aparecer Varela. Este ano, as circunstâncias são diferentes, as condições são diferentes e o FC Porto falhou uma jornada que não podia ter falhado, contra o Feirense. A pressão, de qualquer modo, está quase toda sobre o FC Porto e não, como devia acontecer, sobre o Benfica, que se reforçou para além do imaginável e que decidiu atacar o título com aquela saborosa vaidade do costume. A culpa é do FC Porto, que falhou contra o Feirense. É nos pequenos jogos (nos detalhes) que se decidem os destinos. Co Adriaanse, que não era dos meus favoritos, sabia isso, por muito que custasse aos adeptos portistas.

Estes, habituados ao caviar (servido na época passada com André Villas-Boas), terão de reaprender a jogar no risco fatal, comandados por Vítor Pereira, que precisa de saber entusiasmar o banco e as bancadas em simultâneo. Talvez seja esta a oportunidade. Por meio golo que seja.

in A Bola - 24 Setembro 2011

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